Marcos Referênciais para uma Política de Ecoturismo no Brasil

 

1. Turismo Mundial

Segundo o Conselho Mundial de Viagens e Turismo, que congrega as maiores empresas multinacionais do setor, o mercado turístico como um todo empregou em 1991 nada menos que 183 milhões de pessoas.

Para 1994, estima-se um crescimento de 10,6%, desse mercado,que passará a oferecer 204 milhões de empregos, correspondendo a um em cada nove trabalhadores do mundo. No período 1985/1993, apesar da recessão mundial, o número de turistas que empreendeu viagens internacionais passou de 380 para 500 milhões. A Organização Mundial de Turismo estima que esse número atingirá 534 milhões em 1995 e 661 milhões no ano 2.000.

No que concerne aos ganhos financeiros provenientes do turismo internacional, mesmo excetuando-se os ganhos do setor de transportes, o crescimento passou de US$ 18 bilhões em 1970, para US$ 324 bilhões em 1993. A Europa, de acordo com os dados disponíveis de 1992, detinha 52% dos ingressos, seguida pelas Américas com 27%, pelo Extremo Oriente e Pacífico com 16% e pela África, Oriente Médio e outras regiões da Ásia dividindo entre si o percentual restante.

Verifica-se, assim, que o turismo se impôs nos últimos anos como um recurso comercial de expressiva importância, disputando com o petróleo a primazia do mercado mundial.

 

1. Segmentação do Turismo

O turismo como uma atividade econômica sofre, também, inovações constantes, em face da competitividade dos mercados e das exigências da demanda.

Em vista disso, as empresas de turismo estão a caminho da especialização, deixando de ser generalistas, e passam a oferecer produtos segmentados, destinados a uma clientela específica.

Nessa segmentação são colocadas à disposição dos turistas diversas opções, como por exemplo:

  • Turismo Cultural
  • Turismo Esotérico
  • Turismo da Maior Idade
  • Turismo Esportivo
  • Turismo Náutico
  • Ecoturismo

O Ecoturismo, em especial, configura-se no momento como uma importante alternativa de desenvolvimento econômico sustentável, utilizando racionalmente os recursos naturais sem comprometer a sua capacidade de renovação e a sua conservação.

Neste segmento diversos nichos de mercado são identificados, como por exemplo, a observação de aves, o safari fotográfico, a observação da flora, dentre outras atividades.

 

2. Panorama Internacional do Ecoturismo

Do ponto de vista mercadológico, o ecoturismo é um segmento que tem crescido a um ritmo considerável ao longo dos anos. Apesar da ausência de estatísticas oficiais relativas à dimensão deste mercado, estima-se que 10% das pessoas que viajam sejam ecoturistas.

Porém, a inexistência de uma definição globalmente aceita para o ecoturismo, e o consequente enquadramento das atividades que devem ser consideradas nesse segmento, vêm dificultando estudos abalizados e conclusivos sobre a matéria.

Há, no entanto, consenso entre os empresários de que este é um mercado em franca expansão, sendo estimado o seu crescimento em cerca de 20% ao ano, conforme resultados obtidos em entrevistas realizadas junto a operadores turísticos especializados e peritos e na observação do crescimento de agências operadoras de ecoturismo. (Ziffer, 1989, P.10)

Além dos fatores mencionados, a conscientização da sociedade relativamente às questões ambientais tem contribuído para o crescimento da demanda por atividades ecoturísticas.

De fato, a forte percepção mundial acerca da necessidade urgente de proteção e recuperação dos recursos naturais, originária, principalmente, da disseminação dos movimentos conservacionistas empreendidos por grupos ambientalistas, forças políticas e meios de comunicação, acaba por influenciar a escolha dos destinos e roteiros a serem programados.

Entretanto, a oferta de destinos ecoturísticos depende, essencialmente, da existência de áreas de elevado valor ecológico e cultural, da maneira como estas áreas são geridas, da existência de infra-estruturas adequadas e da disponibilidade de recursos humanos capacitados.

Exemplos podem ser mencionados de países que oferecem destinos ecoturísticos adequados, obtendo, com isso, valores significativos de divisas com seus parques nacionais. (OMT/PNUMA, 1992 p.6-7)

O Quênia obteve em 1988 com o turismo, que é a atividade que mais rende divisas para o país, US$ 400 milhões. Este país, inclusive, desenvolveu um modelo de valoração sobre a atração turística dos animais do Parque Nacional Amboseli. Segundo esse modelo, um leão vale US$ 27 mil anuais, enquanto o valor de uma manada de elefantes é de US$ 610 mil.

Em Ruanda, os turistas que desejam ver os gorilas do Parque Nacional dos Volcans despendem, anualmente, US$ 1 milhão em ingressos e de US$ 2 a 3 milhões em outros gastos.

Nos países desenvolvidos, o ecoturismo é uma atividade ainda mais vantajosa. Apenas o sistema de parques nacionais dos Estados Unidos, considerado como a maior rede de atração turística natural do mundo, recebeu mais de 270 milhões de visitantes em 1989. Já os parques estaduais atraíram mais de 500 milhões. No que se refere aos visitantes dos parques nacionais e estaduais dos Estados Unidos, cerca de 29,5 milhões de americanos, com idade superior a 16 anos, realizaram viagens com a finalidade primordial de observar e fotografar a fauna. A observação de aves foi a atividade recreativa mais importante, atraindo 25 milhões de pessoas.

Para a América Latina, onde o ecoturismo começa a despontar, a atividade se reveste de extrema importância para os esforços nacionais de promoção do desenvolvimento econômico e social. O adequado aproveitamento dos variados ecossistemas existentes, ainda pouco explorados, propiciará a abertura de novas alternativas econômicas e a consequente melhoria das condições de vida das populações diretamente envolvidas, além de reduzir alguns dos impactos negativos causados pelo turismo tradicional, devido ao perfil e às expectativas dos visitantes que normalmente viajam em pequenos grupos em comparação com o turismo de massa.

Com objetivo de obter um melhor entendimento sobre o ecoturismo na América Latina e o Caribe, foi realizada uma pesquisa, em 1988, junto aos turistas que visitavam o México, Belize, Costa Rica, República Dominicana e Equador.(BOO, 1990)

Nos cinco países estudados, 58% do total de turistas consultados revelaram o nome de um parque ou de uma área protegida que haviam visitado. Desse grupo, 28% visitaram dois parques e 13% visitaram três. Esses números apontam que um elevado percentual de turistas, independentemente das razões que apresentam para visitar um país, frequentam parques nacionais, comprovando a indissociável afinidade entre essas unidades e o ecoturismo.

 

3. O Potencial Ecoturístico Brasileiro

O Brasil tem uma superfície de 8.511.596,3 km².

No âmbito dessa extensão continental abrange desde regiões equatoriais ao norte até áreas extra-tropicais ao sul, diferenciadas climática e geomorfologicamente, com uma extraordinária diversidade ecológica.

Incluído dentre os países de mega diversidade, detém um número entre 10% e 20% do total de espécies do planeta. Esta riqueza conhecida corresponde a 22% da flora, 10% dos anfíbios e mamíferos e 17% das aves do mundo.

A superfície territorial brasileira abriga diferentes ecossistemas, destacando-se:

Floresta Amazônica

A Amazônia Central abriga o maior complexo hídrico-fluvial da Terra, com cerca de 7 milhões de km² , sendo uma região de dimensões continentais. A hiléia brasileira com cerca de 3,3 milhões de km² sobrepõe-se, em grande parte, à área da bacia hidrográfica do Rio Amazonas e caracteriza-se por abrigar grande riqueza biológica, com enorme diversidade de flora e fauna. É considerada uma das últimas reservas florestais do planeta.

Mata Atlântica

Engloba um diversificado mosaico de ecossistemas florestais com estruturas e composições florísticas bastante diferenciadas, acompanhando a diversidade de solos, relevos e características climáticas da vasta região onde ocorre. Estes ecossistemas são caracterizados por uma grande diversidade biológica e altos graus de endemismo da flora e da fauna.

Cerrado

É o segundo maior bioma do Brasil e da América do Sul, ocupando mais de 2 milhões de km² e abriga um rico patrimônio de recursos naturais renováveis, adaptados às duras condições climáticas edáficas e hídricas, que determinam sua própria existência.

Pantanal

O Pantanal é a maior área de terras inundáveis da América do Sul, compreendendo a totalidade da bacia do Alto Paraguai, uma área de 496.000 km², dos quais 393 estão localizados no Brasil.

A porção brasileira da Bacia abrange dois ecossistemas independentes: a parte baixa da Bacia - planícies de inundação - e a parte alta da Bacia - ou margem/borda, onde vivem inúmeras espécies, desde endêmicas até migratórias.

Caatinga ou Semi-árido

A Caatinga cobre aproximadamente 825.143 km² do Nordeste e parte do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, apresentando planícies e chapadas baixas. A vegetação é composta de vegetais lenhosos, misturados com grande número de cactos e bromélias.

A secura ambiental, pelo clima semi-árido, e sol inclemente impõem hábitos noturnos ou subterrâneos. Répteis e roedores predominam na região. Entre as mais belas aves estão a arara azul e o acauã, um gavião predador de serpentes.

Floresta de Araucária

A Floresta de Araucária, também conhecida como "Complexo dos Pinhais", pela predominância do pinheiro brasileiro, constitui uma formação vegetal heterogênea: mata de araucárias (pinhais), campos e paredões rochosos vegetados formando escarpas de até 300 metros de queda livre.

Campos do Sul

Os campos da Região Sul do Brasil são denominados "pampas", termo de origem indígena para "região plana". Esta denominação, no entanto, corresponde somente a um dos tipos de campo.

Outros tipos, conhecidos como campos do alto da serra, são encontrados em áreas de transição com a floresta de Araucária. Em outras áreas encontra-se, também, um campo de fisionomia semelhante à savana. Merecem destaque os campos inundáveis, como é o exemplo o "Banhado do Taim". Esses campos são importantes reservas naturais da vida selvagem.

Manguezal

O manguezal ou mangue é um tipo de vegetação litorânea que constitui um dos mais típicos ecossistemas tropicais de grande importância ecológica e geológica. A fauna, em especial as aves e invertebrados, ocupa nichos ecológicos importantes e diversificados.

Zonas Costeiras e Insulares

O litoral brasileiro tem uma extensão de 7.367 km, apresentando uma imensa gama de ecossistemas: campos de dunas, ilhas, recifes, costões rochosos, baías, estuários, brejos, falésias e baixios.

Áreas Protegidas

Um dos principais mecanismos de proteção da excepcional diversidade biológica, dos endemismos, das estruturas geológicas de relevante significado e da considerável riqueza paisagística do Brasil é o sistema de áreas protegidas.

Cerca de 3,9% do território nacional estão sob a proteção federal na forma de diferentes categorias, distribuídas em 35 Parques Nacionais, 23 Reservas Biológicas, 21 Estações Ecológicas, 16 Áreas de Proteção Ambiental, 9 Reservas Extrativistas e 39 Florestas Nacionais.

Há, ainda, as Reservas Particulares de Patrimônio Natural - RPPN's - que são áreas de conservação em propriedades privadas, para as quais existe uma legislação federal específica. A intenção da lei é a criação de uma rede particular de unidades de conservação onde o proprietário, por sua livre iniciativa, grava de perpetuidade parcela representativa de sua propriedade como Reserva Particular do Patrimônio Natural. Concebido pelo Ibama, este programa já conta com mais de 100 (cem) reservas particulares, bastante expressivas do ponto de vista ecológico e paisagístico, e seus proprietários recebem o incentivo de isenção do Imposto Territorial Rural (ITR).

À primeira vista pode parecer que este universo de unidades de conservação é suficiente para proteger não só amostras significativas dos ecossistemas brasileiros como para garantir a perenidade de sua biodiversidade.

Entretanto, existem áreas de enorme importância que não estão protegidas apesar de já terem sido propostas e indicadas para proteção. Há que se ampliar esta rede de unidades de conservação levando-se em conta a sua fragilidade, o grau de ameaça de destruição e sua importância para a conservação de espécies raras ou ameaçadas de extinção.

Ao lado da insuficiência do número de áreas protegidas há também o grande problema de implantação das já existentes e criadas legalmente. A deficiência de pessoal em número e qualificação, a falta de regularização fundiária das áreas de uso indireto e a inadequada infra-estrutura exigem do poder público uma ação imediata para proteger adequadamente estas áreas e fazê-las cumprir seu importante papel ecológico e social.

E é justamente em algumas dessas áreas protegidas, em especial nos Parques Nacionais, Estaduais e Municipais, nas Florestas Nacionais, nas Áreas de Proteção Ambiental - APA's onde se opera o ecoturismo. São elas o primeiro destino ecoturístico procurado pelos fluxos nacionais e internacionais.

É importante assinalar que em algumas áreas protegidas, como as Reservas Biológicas e Estações Ecológicas, não se opera o Ecoturismo devido à fragilidade destes ecossistemas onde a visitação é incompatível com os objetivos de manejo preconizados para estas Unidades de Conservação.

O conjunto de Unidades de Conservação sob jurisdição federal, à exceção das reservas biológicas e estações ecológicas, somado às áreas protegidas estaduais e municipais e às propriedades particulares adaptadas para fins turísticos, oferecem, juntamente com a rica diversidade cultural, condições excepcionais para o desenvolvimento do ecoturismo no Brasil.

 

 

4. Impactos do Ecoturismo

Os impactos negativos e positivos que poderão advir da atividade de ecoturismo estão, a princípio, relacionados a danos potenciais ao meio ambiente e à comunidade e, por outro lado, aos benefícios sócio-econômicos e ambientais, esperados a níveis regionais e nacional.

Com efeito, a fragilidade dos ecossistemas naturais, muitas vezes, não comporta um número elevado de visitantes e, menos ainda, suporta o tráfego excessivo de veículos pesados. Por outro lado, a infra-estrutura necessária, se não atendidas normas pré-estabelecidas, pode comprometer de maneira acentuada o meio ambiente, com alterações na paisagem, na topografia, no sistema hídrico e na conservação dos recursos naturais florísticos e faunísticos.

O alijamento das populações locais se configura, também, como outro risco, pois a presença de operadores, quase sempre sem nenhuma relação orgânica com a região, pode gerar novos valores incompatíveis com os comportamentos locais, ocasionando conflitos de ordem cultural e de outras ordens.

Em contrapartida aos riscos ambientais e comunitários, o ecoturismo apresenta significativos Benefícios Econômicos, Sociais e Ambientais, tais como:

  • Geração local de empregos,
  • Fixação da população no interior,
  • Diversificação da economia regional, através da indução do estabelecimento de micros e pequenos negócios,
  • Melhoramento das infraestruturas de transporte, comunicações e saneamento,
  • Criação de alternativas de arrecadação para as Unidades de Conservação,
  • Diminuição do impacto sobre o patrimônio natural e cultural,
  • Diminuição do impacto no plano estético-paisagístico,
  • Melhoria nos equipamentos das áreas protegidas.

Dessa forma, a compatibilidade do ecoturismo com o dimensionamento do número de visitantes e do fluxo de transporte, a adoção de parâmetros para implantação da infra-estrutura, o respeito e valorização da cultura local são condições básicas e imprescindíveis para o desenvolvimento harmônico da atividade no Brasil.

 

Diretrizes da Política Nacional de Ecoturismo

Oficina de Planejamento